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Lívia Rolim

PSICÓLOGA

A romantização do autocuidado e o vazio que ela deixa

  • Foto do escritor: Livia Rolim
    Livia Rolim
  • 23 de set.
  • 2 min de leitura

Vivemos numa era em que self-care virou promessa de cura, tapete mágico contra ansiedade, estresse, culpa e exaustão. Aromaterapia, velas perfumadas, banhos de espuma e playlists relaxantes são belos — muitos já ouviram falar —, mas costumam ser apresentados como se fossem suficientes. E quando não são, deixa um vazio que dói.

Hoje eu quero te convidar a questionar esse discurso, olhar o que está por trás da imagem instagramável do autocuidado, e entender por que ele, quando usado como solução única, pode falhar — e até machucar.


De onde veio esse “autocuidado idealizado”

  • Originalmente, autocuidado era uma prática íntima, uma necessidade de ter espaços de cuidado consigo mesmo, de regulação emocional, de descanso profundo.

  • Com a expansão da indústria do bem-estar, redes sociais, marketing e consumo, autocuidado foi “vestido” de glamour. Tornou-se produto, imagem, rotina polida, checklist visual, algo que se mostra fora tanto quanto se pratica.

  • O que era radical virou estética. O que era político virou tendência. Esse deslocamento tem consequências reais.


O que o discurso comercial de autocuidado vende — e o que ele deixa de fora


O que vende

O que negligencia / omite

Ritmos perfeitos: manhãs calmas, rotinas de beleza, terapias de “luxo”

A realidade de quem vive sobrecarga, prazos apertados, exaustão física, emocional, social

Produtos que prometem relaxamento instantâneo ou alívio rápido

O tempo, o processo, a imperfeição, os momentos de desconforto, a necessidade de suporte profissional

Autocuidado “estheticado” para mostrar nas redes sociais

O autocuidado que ninguém vê: dizer “não”, buscar ajuda, descansar, pausar, processar o sofrimento

Soluções individuais: apps, óleos essenciais, diários bonitos, sessões de spa

O impacto das condições sociais, econômicas, estruturais, culturais sobre saúde mental. O que a pessoa “tem acesso” pra praticar autocuidado real.


Por que esse ideal ilusório pode deixar um vazio


  • Frustração e culpa: Quando compramos que autocuidado é aquilo tudo de “bem estar visual”, e não conseguimos manter ou reproduzir, nos sentimos “menos”, “falha”, “insucesso”.

  • Comparações sociais: Redes sociais amplificam a ideia de que “todo mundo está cuidando de si” com perfeição — pouca gente mostra os dias em que não dormiu, não fez skincare, não praticou nada relaxante, ou simplesmente cedeu ao cansaço.

  • Superficialidade disfarçada de profundidade: Banho de espuma pode dar alívio momentâneo, mas se não houver cuidado emocional (como identificar sentimentos, conversar sobre dores, buscar apoio), pode virar anestesia confortável, mas que não cura.

  • Custo financeiro e emocional: Se o autocuidado vira consumo, vira gasto constante. Se vira obrigação estética, vira estresse: “tenho que cuidar bem”, “tenho que postar algo bacana”, “me sentir relaxada como nos reels”. E quando falha, nos sentimos envergonhadas ou julgadas.


O que pesquisas apontam

  • Um artigo recente analisa como ferramentas de self-soothing (auto-acalmar) tornaram-se mercadorias comercializadas, com marketing e apelos visuais mais valorizados que a eficácia psicológica. (ResearchGate, 2024)

  • Outro estudo descreve como a indústria de bem-estar transformou a ideia de autocuidado num mercado de US$ 1,8 trilhão, onde apps, suplementos, gadgets e cosméticos prometem mais do que podem entregar. (Inspire the Mind, 2023)

  • A VerywellMind chama atenção para os limites do autocuidado quando ele se torna uma obsessão por “estar bem”, e para os prejuízos quando colocamos todas as expectativas de nossa saúde mental em práticas de consumo. (VerywellMind, 2023)

 
 
 

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